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quinta-feira, 4 de março de 2010

Crítica Interdisciplinar da pena de prisão


Acontece, caro leitor, que o tempo é o verdadeiro significante da pena e, somente a partir da compreensão de que cada observador possui sua própria medida pessoal de tempo e da necessária dicotomização entre tempo objetivo e tempo subjetivo, é que a pena privativa de liberdade mostra sua verdadeira dimensão punitiva.
Para além disso, a própria legitimação das teorias calcadas na ressocialização e na prevenção (geral e especial) encontra mais um obstáculo na barreira do tempo. Daí porque, na esteira dos agnósticos, estou cada vez mais convencido de que a pena é puro exercício de poder e, portanto, imprescindivelmente condicionado no tempo. E o limite temporal para o exercício desse poder de punir, seja pela duração da pena, seja pelo direito de ser julgado num prazo razoável, adquire, a cada dia, maior relevância.
Após construir uma base sólida para seu discurso, Rodrigo enfrenta o pronto nevrálgico da obra: o tempo no cárcere.
O cárcere não é apenas um instrumento hábil para fixar comportamentos desviantes, senão que se destina a uma fixação da própria culpa pela constante rememorização do crime. Provavelmente, é o mais hábil aparato para fixação de um fato passado e – simultaneamente – negador de qualquer possibilidade de desligamento e libertação dessa triste memória. Como se não bastasse esse pesado fardo, o cárcere dicotomiza tempo de prisão e ritmo social, fazendo com que os discursos “re” fiquem ainda mais alienados (no sentido de que ali-é-nada).
Inegável que 10 anos de pena hoje não representa a mesma coisa (em termos de sofrimento e involução) que 10 anos de pena há 10 dez anos atrás. O ritmo social estabelece tal ruptura, acentuando-a proporcionalmente à velocidade da sociedade e a inércia (engessamento do tempo) do preso. Trata-se de um hiato dificilmente superável. É elementar que o rio que nos banhamos hoje não é o mesmo que nos banhamos ontem, até porque nós não somos os mesmos.... e o rio, tampouco. Nessa linha, a duração excessiva do processo (de conhecimento) faz com que a pessoa condenada na atualidade seja completamente diversa daquela que, há anos atrás, cometeu o delito, e ainda mais diferente daquela que, ao final da execução, sai da prisão.
E, quando sair da prisão, a ruptura estabelecida é de tal intensidade que surge um verdadeiro estigma da exclusão temporal.
Enfim, eis um trabalho para ser lido e pensado.
Parabéns ao autor e àqueles que se dispuserem a investir um pouco de tempo nessa prazerosa e necessária leitura. Com certeza, valerá a pena

Aury Lopes Jr.
Doutor em Direito Processual Penal pela Universidad Complutense de Madrid
Professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS
Pesquisador do CNPq
Advogado

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